2012-05-29
O aviso de António Cluny: a cultura dE justiça vs. (in)cultura dA justiça
«Em Portugal, como na maioria dos países latinos, os códigos de processo, por razões históricas e culturais, tenderam sempre a privilegiar mecanismos que, no essencial, regulam a desconfiança nos próprios tribunais.
Introduzir reformas que pressuponham uma colaboração leal entre as
partes e entre estas e o juiz na definição do verdadeiro objecto do
processo – o conflito real – e, assim, procurar resolvê-lo com verdade e
rapidez, significa remar contra uma cultura forense demasiado
enraizada. Há, ainda, quem prefira sobrepor a lamúria, a bravata fácil e
a arruaça permanentes à busca participada de soluções simples e
eficazes para problemas que, em rigor, já nem deviam existir.
(...)
A discussão das propostas que se anunciam irá, pois, contar com dois
tipos de críticas e de críticos. De um lado, os que sentem a necessidade
verdadeira de as melhorar e que formularão objecções, apresentarão
alternativas pensadas e procurarão soluções compatíveis com a urgência
do aperfeiçoamento do sistema.
De outro, o criticismo tremendista dos que apenas sentirão fugir o
terreno propício à desautorização mediática das decisões judiciais
desfavoráveis, opção que sempre justificou muita inépcia e amadorismo e
serviu, sobretudo, para manipular mercenariamente a opinião pública,
quando se jogaram na Justiça interesses política, económica e
socialmente relevantes.
Introduzir tais reformas exige pois coragem e uma capacidade de
iniciativa política muito alargada, diálogo efectivo e
multi-direccionado e, acima de tudo, uma cuidadosa preparação conjunta
dos profissionais do foro para uma cultura judicial totalmente nova.
Se assim não for, o risco de insucesso pode ser enorme.»
Fonte: iInformação